Lidando com Sentimentos Difíceis
(Instrumento desenvolvido por
Kingsley Mudd, http://contextualscience.org/)
Você frequentemente se encontra lutando contra sentimentos dolorosos ou
difíceis? Por exemplo:
- Raiva ou frustração tão intensas que você sente que está
prestes a explodir?
- Tristeza que parece que irá lhe esmagar e puxar
para o fundo do poço?
- Ansiedade ou culpa que lhe impedem de se engajar em
atividades que são importantes para você?
Você já tentou de todas as maneiras se livrar desses
sentimentos desagradáveis, mas de alguma forma eles simplesmente continuam
aparecendo?
Se você é um ser humano, então sua resposta a essas questões vai ser,
muito provavelmente, sim. Goste ou não, sentimentos difíceis/dolorosos são
uma experiência humana universal e a maioria de nós se encontra lutando
contra ou tentando se livrar desses sentimentos com uma certa
regularidade. Na cultura ocidental,
parece que somos frequentemente encorajados a encarar sentimentos dolorosos
como uma espécie de aberração – um inconveniente a ser evitado tanto quanto
for possível, um sinal de que há algo errado conosco, uma doença que precisa
ser curada, uma irritação a ser abafada por uma variedade infinita de
distrações. Existe um pressuposto não-declarado de que felicidade significa
sentir-se bem o tempo todo e, se não estamos nos sentindo bem, concluímos
então somos defeituosos de alguma forma – talvez não estejamos tendo
pensamentos positivos suficientes, ou não sejamos atraentes o suficiente, ou
populares o suficiente, ou talvez apenas precisemos aderir ao modismo da hora
ou adicionar mais alguns amigos em nossa conta do Facebook... e assim por
diante.
Infelizmente, nossos esforços
para evitar ou nos livrar de sentimentos desagradáveis tendem a ser um tiro
pela culatra e, no fim das contas, geram mais sofrimento. Para dar um exemplo óbvio, um viciado irá usar
drogas, álcool, jogos, pornografia, etc. para tentar se livrar dos sentimentos
dolorosos – e isso funciona por um curto período, mas então ele acorda no dia
seguinte e os sentimentos dolorosos estão de volta, geralmente piores do que no
dia anterior, então ele consome um pouco mais de álcool/drogas/etc. e assim o
ciclo da dependência continua em uma espiral descendente.
Um exemplo menos óbvio são os transtornos de ansiedade. Não há nada
fundamentalmente patológico em relação ao sentimento que chamamos de ansiedade –
na verdade, ansiedade é uma resposta humana normal a qualquer situação em que
nos encontramos “fora de nossa zona de conforto”, e potencialmente expostos a
alguma forma de perigo. A ansiedade apenas se torna um transtorno quando
decidimos que os sentimentos ansiosos, em si, são de algum modo errados, ruins
ou perigosos, e começamos a usar diferentes tipos de estratégias (por exemplo:
não sair de casa, lavar as mãos constantemente, usar álcool, nos distrairmos
excessivamente) para evitar esses sentimentos. Então sempre que um sentimento de ansiedade aparece, ficamos ansiosos
devido ao fato de estarmos nos sentindo ansiosos... percebe o ciclo vicioso?
Uma maneira mais produtiva de lidar com sentimentos difíceis é vê-los
como “mensageiros” – como
um sistema de alarme, primitivo e construído pela evolução, que nos alerta
sobre o fato de que algo “não está certo” com o nosso mundo e que uma ação
imediata talvez seja exigida para enfrentar a situação! As emoções também podem
servir para nos lembrar do que realmente valorizamos em relação a uma situação
em particular ou à vida em geral. A tabela a seguir ilustra brevemente esse
conceito:
Emoção/Sentimento
|
Gatilho/Mensagem
|
Valor/Ação
|
Tristeza
|
Uma perda significativa
|
Cuidado/compaixão consigo mesmo
e com outros; Necessidade de se ajustar e se adaptar à perda
|
Raiva
|
Dano ou injustiça
|
Proteger a si mesmo ou a entes
queridos; Necessidade de lutar por seus direitos
|
Ansiedade/Medo
|
Perigo – real ou percebido
|
Se o perigo for real – defender-se ou fugir!
Se o perigo for percebido, parar por um momento para considerar
respostas adequadas!
|
Culpa/Vergonha
|
Um erro ou mal foi cometido
|
Refletir sobre e aprender com o
evento; Pedir desculpas?; Fazer melhor na próxima vez!
|
Nojo
|
Algo tóxico/contagioso
|
É necessário cuidado; garantir
a segurança!
|
Contudo, nem sempre é fácil interpretar a mensagem e, algumas vezes,
sentimentos dolorosos parecem vir do nada. Nesses casos, pode ser útil simplesmente ver
os sentimentos como “eventos climáticos internos”; alguns dias são ensolarados
e quentes; alguns dias são frios, úmidos e deprimentes – nós não tentamos mudar
o clima (é inútil!), nós simplesmente o reconhecemos e ajustamos nosso
comportamento conforme o necessário (por exemplo: pegamos um guarda-chuva ou
passamos protetor solar), sabendo que
inevitavelmente o evento climático irá passar, seguindo seu rumo natural.
Um pré-requisito básico para lidar efetivamente com sentimentos difíceis
é cultivar a habilidade de se distanciar mentalmente do sentimento e
simplesmente observá-lo, para que possamos interpretar a mensagem e tomar a
atitude apropriada, ao
invés de simplesmente se deixar levar por uma enxurrada de emoções e se acabar
se comportando de forma potencialmente destrutiva. Na psicologia moderna, essa
habilidade de se distanciar e observar experiências internas é conhecida como mindfulness (atenção plena).
Pesquisas científicas recentes mostraram que praticar regularmente
exercícios simples de mindfulness pode melhorar significativamente
nossa habilidade de lidar efetivamente com sentimentos difíceis. Veja a seguir
um exercício simples de mindfulness chamado “N.A.M.E. it to Tame it”
(Nomeie-o para amansá-lo).
Passo 1: Perceba: - Perceba onde o sentimento doloroso está localizado – garganta? peito?
abdômen? outro local? em vários lugares? Agora foque sua atenção na parte do
corpo onde o sentimento é mais intenso e intencionalmente observe a sensação, como se você fosse um cientista
curioso que nunca havia encontrado um sentimento como esse antes. Perceba quaisquer características, como
movimento, pressão, temperatura, vibração, pulsação. O sentimento tem um “sabor”, por exemplo, medo, raiva ou nojo?
Enquanto você faz isso, sua mente certamente irá tentar distrai-lo com
pensamentos como “Eu odeio esse sentimento”, “Eu quero que isso vá embora”,
etc.; quando isso acontecer, simplesmente agradeça sua mente por esse
comentário interessante, e retorne sua atenção para sensação.
Passo 2: Reconheça: - Use algumas palavras para reconhecer o sentimento. Talvez diga para si
mesmo “Eu estou notando um sentimento de ansiedade/raiva/nojo/etc.”. Tente
fazer isso com compaixão e sem julgamentos. Note qualquer ímpeto de julgar,
criticar, lutar ou se livrar do sentimento; procure deixar esse ímpeto ir e
vir, e permita que o sentimento seja como
é. Se você tem a sensação de que este sentimento está lhe transmitindo
alguma mensagem (vide exemplos na tabela anterior), pare um momento para
reconhecer que mensagem pode ser essa. Tente colocar a palma da sua mão, com
compaixão e gentileza, sobre a área dolorosa: na maioria das vezes, isso é
reconfortante.
Passo 3: Dê espaço: - Por alguns segundos, mude a sua atenção para a sua respiração. Inspire
profundamente e devagar, duas ou três vezes, mexendo sua barriga, não o seu
peito. Então, enquanto você faz a próxima inspiração, dirija a respiração para dentro e por volta daquele sentimento intenso que
você vem observando. Você pode interpretar esse processo da maneira que desejar
– apenas tente imaginar que, de alguma forma, você está respirando para dentro
e ao redor da sensação. E, enquanto você faz isso, de uma maneira mágica, um
grande espaço está se abrindo dentro de você. Então, em vez de reprimir,
esmagar ou comprimir o sentimento, você faz exatamente o oposto e se abre,
dando muito espaço para o sentimento. Você
não precisa gostar do sentimento, você simplesmente permite que o sentimento
esteja lá e abre espaço para ele. Pode ajudar tentar imaginar que o
sentimento é como um inseto com asas (talvez uma vespa?) que está agitado e
zumbindo alto por estar em um espaço confinado. Contudo, a cada inspiração,
você está enchendo um grande balão ao redor do inseto, dando ainda mais espaço
para que ele voe, de modo que ele fique muito menos estressado e e com menos
vontade de picar alguém!
NOTA: se você achar que respirar para dentro do sentimento é muito difícil ou
não está ajudando, então apenas continue a respirar, devagar e profundamente,
movimentando sua barriga, e não o seu peito.
Passo 4: Expanda a consciência: - Agora você pode permitir que sua consciência
se expanda gradualmente, de modo que você não repare apenas o sentimento, mas
perceba gradualmente o resto do seu corpo e tudo o que você pode ouvir, ver,
sentir, tocar e cheirar. Alongue-se gentilmente, solte seu corpo, e torne-se
consciente daquilo que está a sua volta. Perceba que você pode estar ciente do
sentimento doloroso e, ainda assim, estar também ciente do resto de sua
experiência. Agora você pode decidir que atitude tomar, baseado em seus valores
pessoais e não controlado por suas emoções!
Por favor, note: - Apesar de frequentemente as pessoas sentirem
que esse exercício reduz a intensidade do sentimento doloroso, isso nem sempre
ocorre e não é o propósito do exercício. O objetivo é cultivar uma consciência
plena em relação aos sentimentos dolorosos, para que não sejamos esmagados por
eles e para que possamos tomar uma atitude efetiva para melhorarmos nossas
vidas, mesmo na presença de sentimentos difíceis.
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